Balance 010:Jimmy Van M

Nesta minha primeira intervenção no Temperamental Soul começo por agradecer o convite ao diggers, acrescentando que é com prazer que passo a colaborar neste seu excelente blogue. Com apenas cerca de um mês e meio para o final do ano, comecei a reflectir sobre todas as compilações de música electrónica que tive oportunidade de ouvir este ano. Muitas compilações foram editadas neste ano, talvez até demais. Muitas desiludiram, algumas agradaram, e a boa maioria passou com indiferença por não apresentarem nada de novo ou por serem cópias umas das outras. Felizmente a música electrónica, mesmo quando passa por ciclos pouco criativos consegue (quase) sempre todos os anos apresentar trabalhos que acabam por surpreender causando uma espécie de “terramoto” que abala positivamente a comunidade mundial de música electrónica. É com enorme prazer que constato que uma dessas compilações acabou por ser justamente aquela em quem depositava mais esperanças para este ano: Balance 010 mixed by Jimmy Van M. Jimmy Van M é o segundo Dj nova-iorquino a ser convidado para misturar as já afamadas “Balance series” da excelente editora australiana Eq Grey, o primeiro foi Chris Fortier que misturou a “Balance 007”. Jimmy é por muita gente conhecido apenas por ter sido o principal impulsionador, o “tour mastermind” por assim dizer, da famosa Delta Heavy Tour de Sasha & Digweed nos EUA, um dos feitos mais incríveis da história mais recente da dance music, se tivermos em consideração que já é incrivelmente difícil para bandas pop britânicas conseguirem singrar no mercado americano, quanto mais meros Djs que qu fazem parte de uma comunidade sonora que é pouco ouvida nos EUA(apesar das raízes da música electrónica serem provenientes de Chicago e Detroit). Contudo, Jimmy é muito mais do que o mero "tour mastermind" da Delta Heavy tour, ou do que um excelente Warm-up Dj como algumas pessoas o consideram. É muito mais do que isso e esta compilação comprova-o. Ao longo da sua carreira Jimmy tem-se destacado exactamente por apresentar nos seus sets ao vivo sons apelidados de futuristas que quebram barreiras existentes. Os seus set´s, apesar de terem como base o progressive house, são viagens musicais quer esteja apenas a fazer o warm-up para John Digweed ou seja o Guest Dj principal da noite. O Disco 1, apelidado de “Downtempo” é perfeito para se ouvir à beira da lareira agora que o Inverno chegou. Começa com 2 faixas de Bill Laswell (cada um dos 3 discos começam com dose dupla do mesmo produtor). A primeira “Ethiopia”, com uma vocal feminina africana deixa-nos logo um prenúncio de que acabámos de entrar numa espécie de viagem sonora pelo mundo, viagem essa que parece começar no continente africano. Segue-se Future Sound of London - ‘Study of Six Guitars’ que nos apresenta um loop de guitarra a fazer lembrar ritmos asiáticos. Um pouco mais à frente o velhinho Coldcut- ‘Autumn Leaves’ é recuperado do baú de grandes temas de música electrónica esquecidos, servindo como uma espécie de intro para uma faixa deliciosamente melancólica chamada Union Jack – ‘Water Drums’. A toada melancólica continua mais umas faixas até a “Falmer” de Nathan Fake sirva de entrada para a primeira faixa dos escoceses Boards of Canada nesta compilação, faixa essa intitulada ‘Dayvan Cowboy’. Contudo, o melhor está ainda por vir com a fabulosa remistura dos Thievery Corporation da música Wax Poetic-‘Angels’, que conta a vocal de Norah Jones por cima de um bassline bem dubby; ou com a fabulosa Everything You is a Balloon’dos Boards of Canada a entrar em ritmos mais electrónicos, seguida de uma das mais brilhantes faixas de toda esta compilação Brian Eno & J. Peter Schwalm – ‘Rising Dust’, que serve ainda de aperitivo para a magistral remistura de Goldfrapp para a famosa Halo dos Depeche Mode, onde temos uma espécie de dueto entre Dave Gahan com Alison Goldfrapp, acompanhados por ritmos orquestrais. Se nesta altura achamos que já ouvimos o melhor desta compilação, rapidamente nos enganamos pois ainda está por aparecer uma estrondosa faixa com ritmos de acid house chamada Bonobo – ‘Everything You Do’- que fecha em grande este primeiro cd. O disco 2 começa com duas excelentes faixas de Miles Tilmann continuando na toada downtempo do disco 1. Apenas na 5ª faixa- Speedy J – ‘Oil Zone’ a toada sonora muda, servindo esta excelente música como ignição para ritmos mais industriais e electrónicos. Daqui para a frente tudo muda e torna-se bem mais uplifting como nas duas faixas de Adam Johnson, ou nas estrondosas faixas ‘Skyliner’ dos Boards of Canada ou Babel – ‘X-Equals’, que por momentos nos dão a sensação de estarmos temporáriamente in loco num estúdio de um filme de ficção científica a contemplar a construção de uma fabulosa banda sonora para esse filme. Contudo, a cereja no topo do bolo ficou reservada para um final de quase 15minutos(!) com a mítica remistura dos Underworld para a faixa ‘Cool Kids of Death de Saint Etienne, um verdadeiro clássico da história da música electrónica! Simplesmente perfeito! Se o disco 1 e 2 apresentam lados menos conhecidos de Jimmy Van M enquanto Dj, o disco 3 é o mais orientado para as pistas de dança, apresentando o tipo de som que Jimmy Van M anda a tocar nos seus gigs um pouco por todo o mundo. Neste disco destacam-se a fabulosa Jet, mais uma das faixas da colaboração Ellen Allien & Apparat presentes nesta compilação ou estrondoso Tom Pooks – ‘Docker’, música capaz de arrasar com qualquer pista de dança do mundo! O final deste disco reserva também um dos destaques desta compilação, com a remistura de Michael Mayer e Superpitcher para a música “Like You” daquele que é seguramente o melhor produtor brasileiro e uma das boas surpresas no campo da produção do momento, Gui Boratto. Para concluir, esta compilação é seguramente um dos melhores Dj mixes a que tive o prazer de ouvir nos últimos anos. Penso que ultrapassa mesmo outras fabulosas Balance series da Eq Grey, como o magistral Balance 005 de James Holden, e deixa-me sinceramente honrado por ter tido o privilégio de a ouvir. Por muito estranho que possa parecer o uso deste termo, honrado, foi exactamente esse o sentimento que tive quando ouvi esta compilação pela primeira vez há poucos dias quando seguia no metro de Lisboa a caminho da Universidade onde estudo para mais uma manhã de trabalho. Ao olhar para as pessoas sentadas à minha frente e ao meu lado veio-me logo à cabeça a ideia de que estas provavelmente nunca na vida terão o privilégio de ouvir esta verdadeira viagem musical que no momento me deixou completamente arrepiado (no bom sentido), pois tudo o que estava a ouvir e a sentir era apenas para mim. Sempre acreditei que compilações com características como estas Balance Series são um reflexo do que vai na mente do Dj em questão, bem como uma espécie de "partilha" da sua alma e personalidade. Este Balance 010 é uma compilação complexa e inteligente vinda de um Dj que sempre se preocupou por quebrar com barreiras sonoras aparentemente complexas.A música electrónica devia ser sempre assim... Classificação: 10/10